4 de novembro de 2008

Glorificando a Deus através do seu ministério

Reflexões acerca do pensamento de John Piper sobre o trabalho pastoral

Pelo Pastor Juan de Paula

“O ministério da pregação é o centro da minha vida. Oro para que, através dele e de tudo o que eu fizer, a grande glória de nosso Deus e Salvador Jesus Cristo seja manifestada, e que, a cada dia, mais e mais pessoas vivam em obediência e fé, em crescente intensidade.” John Piper


Introdução


Li um texto do Rev. Ricardo Agreste, pastor na Comunidade Presbiteriana Chacara Primavera em Campinas-SP, intitulado Ser Pastor hoje o qual ele reflete sobre o pensamento de Eugene Peterson acerca da vocação pastoral. Esse texto me levou a refletir sobre a importância de nós pastores termos algum autor conceituado, com ministério estabilizado e bastante experiência na sabedoria pastoral como mentor ou usando a línguagem de Peterson “um diretor espiritual”. A necessidade está no fato de que todos nós pastores concordamos com João Calvino quando diz que o ministério pastoral é uma obra árdua de uma dificuldade imensa de suportar. Meus recém 2 anos e meio de pastorado já foram suficientes para perceber que tal sentença é real, experimentada e verdadeira.


Recentemente li alguns textos de pastores presbiterianos que faziam uso de Eugene Peterson e Henri Nowen. Esses dois autores são prolíficos escritores na área de cura das almas, a poimênica, a arte de levarem pessoas a descansarem em Deus em meio do caos que se encontram. Os dois autores partem de uma abordagem de entender a mente do indivíduo pós-moderno para pastorea-los e contextualizar o ministério. Até ai nenhum problema. A questão é que o 1o autor citado flerta com a teologia barthiana que tem suas contribuições mas também sérios deslizes para quem afirma a inerrância e infalibilidade das Escrituras (com isso não quero desmerecer a contribuição de Peterson, ex-professor de AT, para a teologia pastoral contemporânea). O 2o já é de persuasão neo-liberal , o que desanima mais ainda, embora algumas de suas sentenças sejam rasoáveis. Para onde correr então? Alguns tem flertado com a literatura dos movimentos de crescimento de igrejas sensíveis ao não crente no estilo Rick Warren, “Uma igreja com propósitos” ou Bill Hibells com a Willow Creek.


Seguindo a preocupação dos reformadores (que além de grandes teólogos, eram pastores e expositores em igrejas locais), os puritanos prosseguiram com a reforma na área experimental da fé e na dimensão pastoral do cristianismo. Eram pastores preocupados com a pureza da igreja de Jesus e deram continuidade à reforma nessa perspectiva. Richard Baxter e Jonathan Edwards foram excelentes pensadores e dedicaram todo labor à igreja para glória de Deus. Eram teólogos preocupados com vidas transformada. George Whitefield nos mostra como uma boa teologia reformada tem tudo a ver com evangelização e o ganho de almas para Cristo (ele evangelizava bêbados e mundanos, corpo-a-corpo em becos na sua cidade). Charles Spurgeon segue o mesmo caminho. David Brainerd nos deixou um legado em seu diário para missões e o desenvolvimento da grande comissão. Charles Simeon e Richard Sibbes , cujas obras ainda não foram traduzidas para o português, nos legaram um exemplo de perseverança no ministério. Com toda a “água na boca” que esses mestres da teologia pastoral nos deixam, uma acusação pode ser feita: Eles não viveram em nossos tempos! E por mais que os princípios sejam atuais, não deixa de ser uma verdade. D. M Lloyd-Jones marca presença por ser um expositor falecido no século passado e segue em grande medida os puritanos. Mas como aderi a teologia reformada como correta interpretação das Escrituras e a mais plausível (com isso não quero dizer que seja a única) gostaria de caminhar com alguém que tivesse essas mesmas convicções e ainda sim entendesse a mente do nosso tempo e fizesse parte dele. John MacArthur Jr. é um excelente nome para quem busca um mentor pastoral. Desfrutando de uma excelente estabilidade pela graça divina, pastoreia uma grande igreja na Califórnia. Recentemente foi traduzido para o português o texto “Nove Marcas de uma Igreja Saudável” de Mark Dever, um especialista em Eclesiologia que tem trazido luz a muita gente quanto á ser igreja em sua essência. Particularmente, na caminhada pela busca da maturidade ministerial, encontrei em John Piper, pastor de pregação e visão da Bethlehem Baptist Church, em Minneapolis, uma igreja grande, relevante e ativa em missões e presidente do ministério Desiringgod, um “amigo” com quem posso manter diálogos buscando alento e encorajamento no trabalho árduo e espinhoso porém recompensador e glorioso do ministério pastoral. O escolhi para ser um “mentor” por meio de seus escritos e sermões.


John Piper


John Piper se formou em Literatura e Filosofia pela Weaton College, depois de ter desistido da Química. Ouvindo um sermão de Harold Ockenga, enquanto estava no hospital internado por causa da mononucleose, foi chamado ao ministério e mudou seu curso já visando sua preparação para o pastorado. Se especializou em C.S Lewis e leu também sobre Blaise Pascal. Após, seguiu para o seminário Fuller na Califórnia onde obteve o bacharel em divindades. Em sua ordenação ao ministério, Daniel Fuller foi o preletor. Seguiu para Alemanha onde concluiu o doutorado em teologia na Universidade de Munich na área de Novo Testamento com a tese “Love Your Enemies”. Voltando aos E.U.A , lecionou no Seminário Betel em Minneapolis, numa cadeira denominada Estudos Bíblicos. Seis anos depois, cedeu ao irresistível chamado a pregação e assumiu o pastorado na Bethlehem, uma igreja filiada a Convenção Batista Sueca desde 1980. É casado com Nöel.


Filosofia de Ministério


Extremamente influênciado por Jonathan Edwards, maior teólogo e filósofo da América e um pregador por excelência, Piper foi convencido de que a obediência apenas como dever sem alegria é pecado e legalismo e a glória não é dada a Deus.


O motor do seu ministério é a sentença: “Quanto mais nos satisfazemos em Deus, mais ele é glorificado em nós”. Nisso, ele defende a plena satisfação em Deus. Sua filosofia de ministério é “difundir a supremacia de Deus sobre todas as coisas para a alegria de todas as pessoas através da fé em Jesus Cristo”. A glória de Deus é o seu alvo e a paixão da sua vida.


1 - Teologia e Apologética: A sua filosofia de ministério é fruto de sua teologia. Sua contribuição para a reflexão teológica se dá no livro “Em Busca de Deus” publicado anteriormente como “Teologia da Alegria”. Ali, Piper choca os leitores com o conceito de Hedonismo cristão. Sua re-leitura da primeira pergunta do Breve Catecismo de Westminster “Qual o fim principal do homem? Glorificar a Deus [AO] goza-lo para sempre” (mudança do “e” para o “ao”) nos deixa claro de que fomos criados para glorificar a Deus em tudo e ter plena satisfação Nele em detrimento dos prazeres mundanos e os ídolos do nosso coração.


Piper é o que pode-se chamar de um batista reformado (talvez o mais conhecido na atualidade). Embora não goste de discutir nuances teológicas (não quero dizer irrelevante e sim não-essêncial a salvação) como milênio, dispensacionalismo-aliancismo-neoaliancismo, sabatarianismo e etc…. ele defende os cânones de Dort e as doutrinas da graça (os cinco pontos do calvinismo) , um pacto monergista (Deus é quem toma a iniciativa na regeneração do pecador e na sua aliança com a humanidade sem qualquer mérito humano), a inerrância e infalibilidade das Escrituras (óbvio), a Glória de Deus sobre todas as coisas (ponto de partida de sua reflexão - mencionado anteriormente e a visão do seu ministério) e a concepção bíblica da complementariedade do homem e da mulher, criados com igual valor mas diferentes em suas funções, com isso, Piper defende uma liderança masculina na igreja não por tradicionalismo, mas sim por uma cosmovisão bíblica combatendo o feminismo pós-moderno e a perspectiva igualitária das funções do homem e da mulher, defendida por alguns evangélicos (esse tema foi abordado por ele em sua estada no Brasil em 1994 na conferência Fiel para pastores e líderes).


Destaca-se também a sua luta para com o Teísmo Aberto, ensinamento que esvazia a soberania de Deus e a providência na história e seu conhecimento do futuro.


2 - Pregação:


Piper é um defensor da pregação expositiva. É o foco principal de sua atividade no ministério dentro da sua visão de glorificar a Deus em tudo. Piper defende que o pastor deve exaltar Cristo na pregação. Ele chama de Exultação Expositiva. Através da exposição e aplicação fiel do texto, Cristo é exaltado perante a sua comunidade.


Em seu livro “Supremacia de Deus na pregação” persuade seus leitores a partir de uma abordagem trinitariana da pregação: para glória de Deus, centralizada em Cristo e no poder do Espírito. Na segunda parte do livro, destrinchando a pregação a partir de Jonathan Edwards, os leitores são confrontados a se deleitarem na soberania de Deus, iluminarem as mentes com paixão seguindo a sentença lógica e calor, luz e fogo, pregarem com alegria, pois se os pastores não transmitirem alegria, transmitem legalismo, a sondagem no coração para ministra-lo e a aplicabilidade da mensagem, ou seja, não somente transmitir os conceitos e sentarem, mas aplicar o texto na vida do povo para leva-los a uma vida de intimidade com Deus.


3 - Eclesiologia:


Piper tem caminhado junto com outros pastores batistas norte-americanos para o entendimento bíblico e a necessidade atual da pluralidade de presbíteros na sua igreja local.


Ele também defende uma contextualização da igreja tanto é que a Bethlehem não se reúne apenas em um local, mas eles tem três locais para o culto público se desprendendo da sacralidade da localização física e também trabalha com pequenos grupos em sua igreja para intensificar a comunhão entre os crentes.


Sendo um bom visionário, Piper e sua equipe pastoral criou um centro de treinamento para pregadores e presbíteros denominado “Bethlehem Institute”. Com a crise dos seminários na américa no que tange ao liberalismo teológico e alguma dificuldade de superar o abismo igreja-academia, o objetivo desta instituição é treinar líderes dentro da visão de divulgar e se apaixonar pela supremacia de Deus em todas as coisas para a alegria de todas as pessoas.


A Bethlehem Church também treina plantadores de igreja para que iniciem novas comunidades centradas em Deus, saturadas de Bíblia e servas de Cristo. Para isso, os formados em teologia fazem o curso no instituto e são mentoreados pela equipe pastoral da igreja. Desde 2003 umas 10 igrejas foram plantadas nessa visão.


Destaca-se sua posição firme em relação a insolubilidade do casamento mesmo havendo adultério e não considerando o divórcio como opção em hipótese alguma fazendo uma profunda exegese nos textos usados supostamente como claúsula de excessão, deixando claro ser essa a sua posição pessoal e não a da igreja.


Piper mantém uma visão elevada de santidade na vida cristã e de abstinência a comportamentos carnais e mundanos, lutando inclusive contra o uso da televisão, ferramenta tal que piper considera ser trivial para a vida do crente. Além disso, ele milita contra a cultura que menospreza a Deus e explora a sexualidade de forma visível nos meios de comunicação.


Ele da ênfase ao jejum como uma ferramente para mortician a carne e se aproximar de Deus.


4 - Visão e Evangelização:


Piper não limita seu ministério e labor teológico-pastoral a sua própria igreja local. Por isso a criação do ministério Desiring God (Desejando Deus) para espalhar suas pregações , seus escritos, realizar conferências, editar postagens em blog, ministério com crianças e currículo para Escola Bíblica Domunical e etc….


Esse ministério esteve no Brasil em 2007 com participação na Conferência Fiel para jovens com a missão de checar a influência do ministério do Pastor John Piper no Brasil entrevistando vários pastores e irmãos por todo Brasil, inclusive o autor desta postagem e editor deste blog, este que vos escreve.


Recentemente, publicou o livro Don’t Waste Your Life (Não jogue sua vida fora - já editado em português) apontando para dois caminhos que podem ser perseguidos pelos seres humanos que virou um ministério e tem um site dispovível com guias de estudo sendo uma relevante ferramenta evangelística. Seu folheto “Para sua alegria” recentemente traduzido para o português, também está disponível em diversos idiomas, sendo um folheto bastante contextualizado sem faltar com o conteúdo evangélico.


Ele tem a prática de escrever e publicar diversas meditações devocionais para a edificação do povo de Deus, sendo várias delas traduzidas para o português.


Atualmente se juntou a Mark Dever, Lingon Duncan III e outros no ministério TG4 para a divulgação do evangelho na América.


5 - Mentoria pastoral


Além da sua filosofia de plantação de igrejas com obreiros adeptos de sua visão pastoral, Piper e sua equipe organizam a Conferência Desiring God para pastores (anteriormente Conferência Bethlehem para pastores). Além de chamar um preletor para dissertar um tema (Já foram, John MacArthur Jr, John Armstrong, Daniel Füller, C.J Mahaney, David Powlison e em 2009 o preletor será Mark Dever) ele também escreve biografias de homens de Deus para o encorajamento dos pastores. Não se trata apenas de uma reflexão acadêmica da teologia histórica e sim um estudo profundo da vida destes homens para a edificação dos pastores que vão nas conferências. Os livros “O legado da Alegria Soberana: A graça triumfante de Deus na vida de Agostinho, Lutero e Calvino” e “O sorriso Escondido de Deus: O fruto da aflição na vida de John Bunyan, William Cowper e David Brainerd” foram originalmente desenvolvidos para essas palestras. No site monergismo tem mais duas biografias encorajadoras de John Owen (focando santidade) e D.M Lloyd-Jones e a paixão que exalta o poder de Cristo.


Aplicações e Conclusão


A visão que a graça e a glória de Deus proporcionaram a Piper é fascinante! Sua percepção de adoração é relevante para uma cultura brasileira marcada pela passionalidade e festividade onde o torcedor devota toda a sua paixão quando o time de futebol marca o gol. E num evangelicalismo onde o carismatismo é predominante, Piper propõe uma abordagem de diálogo com aquilo que o movimento carismatico tem de bom sem perder a reflexão bíblico-teológica herdada e defendida pela tradição reformada contextualizando-se ao nosso tempo sem abrir a guarda para o pragmátismo, secularismo, misticismo ou liberalismo teológico para ser relevante a nossa geração.


“Por um lado, temos os conservadores, extremamente meticulosos com as idéias acerca de Deus e com a preocupação de ter as doutrinas corretamente estabelecidas, aos quais digo: Amém! Estou com vocês. Por outro lado, temos os carismáticos, perdidamente simplórios com relação à sua doutrina e entregues à emoção - levantam ãs mãos e batem palmas, seus pés pulam e eles sentem algo diferente, caso contrário o Senhor não está naquele lugar! Também estou com eles! Odeio a separação entre os dois. Farei todo o possível, dentro das minhas forças e enquanto estiver vivo, para ajudar essas pessoas a enxergarem que elas estão dando a Deus apenas a metade da Sua glória. Conhecer a Deus verdadeiramente e não senti-LO da forma devida é dar-LHE apenas metade da Sua glória. Senti-LO de forma devida e não conhece-LO verdadeiramente é dar-LHE apenas metade da Sua glória. Devemos a Deus toda a Sua glória, assim como Jonathan Edwards destacou.” (PIPER, John. A glória de Deus é o alvo do aconselhamento bíblico In: Coletâneas de aconselhamento bíblico - v.6 (2007) Atibaia: SBPV, 1999. P. 9)


É isso ai John Piper - nos ensina a glorificar a Deus em doutrina e deleite com a mente e o coração experimentando a graça e o conhecimento com lógica e calor, luz e fogo.


Nos ensina a exultação expositiva! A expor e exaltar Cristo com alegria e paixão. A pregar o texto bíblico com vontade e descansar no Espírito que fará a obra. Que as igrejas e nossas ovelhas recebam a alegria e Deus seja glorificado.


Suas obras caem como uma luva quando há uma necessidade expressa por um amigo: A urgência de se resgatar o ministério pastoral a partir de uma cosmovisão bíblico-reformada. As editoras Fiel e Cultura Cristã tem nos abençoado ricamente com a publicação de algumas obras que apontam para esse sentido, ex:. A Igreja Discipuladora, excelente para discipulado e bem aplicativa.


Ums observação: quando nos identificamos com um autor e pastor não podemos cometer o erro de exalta-lo. Isso seria idolatria. O próprio Piper, comentando sobre Spurgeon escreveu que montanhas não existem para serem invejadas e sim para espelharem a glória de Deus. O que Deus tem feito com John Piper é derramar a sua graça na vida de um homem para que este possa servir de modelo para outros e Deus será glorificado e nós recebemos alegria influênciados por sua intensidade na busca de saciar a sua sede de Deus.


Sei que todos os leitores não farão a mesma escolha que eu e nem devem. Cada um se identifica com cada autor e se delicia com suas reflexões e leituras a partir de critérios e afinidades. O que me fez encantar com Piper é a sua perícia exegética e a solidez teológica aplicada de maneira prática e devocional numa simetria que poucos conseguem atingir.


Espero que minha postagem lhe empurre para deliciosas leituras

Bom proveito.


A Deus toda a glória.


Bibliografia para pastores


O Legado da Alegria Soberana: A graça triunfante na vida de Agostinho, Lutero e Calvino


O Sorriso Escondido de Deus: O fruto da aflição na vida de John Bunyan, William Cowper e David Brainerd.


Supremacia de Deus na pregação


Teologia da Alegria (todos da Shedd publicações)


A glória de Deus é o alvo do aconselhamento bíblico In: Coletâneas de aconselhamento bíblico - v.6 (2007) Atibaia: SBPV, 1999.


Outros:


CALVINO, João. As Pastorais. Parakletos, São Paulo.


Ex Corde - www.gilsonsantos.com - excelentes artigos do ponto de vista reformado acerca do ministério pastoral.

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