11 de maio de 2010

O Perigo do Desgaste Ministerial


















O preço do chamado

por Daniel Galvão

Os caminhos que levam à carreira eclesiástica podem até variar: das salas de aula de um seminário teológico à consagração direta ao ministério após anos de dedicação e formação numa outra função. No entanto, o que costuma ser igual em todos os casos é o desejo e a expectativa que transbordam no coração do novo pastor. Mas, nem tudo são flores. Ao contrário. Entre o chamado e a consolidação ministerial, muitos desafios têm de ser superados dia a dia. O suor, na maioria das vezes, se mistura às lágrimas e ao longo do tempo as dificuldades acabam interrompendo o sonho de muitos que um dia abdicaram de tudo para se dedicar exclusivamente à igreja.

De acordo com levantamento do Ministério de Apoio a Pastores e Igrejas (Mapi), cerca de 80% das disciplinas dos seminários no país estão voltadas para formar teólogos e não pastores ou líderes. Na visão da entidade, os cursos teológicos, se quiserem ser diferenciais na vida dos futuros ministros, precisarão focalizar em novas matérias na grade curricular como gestão, trabalho em equipe, mentoria, discipulado de líderes, princípios de educação de adultos, a chamada andragogia, resolução de conflitos e terapia familiar. Somente assim, formandos deixarão de sair das salas de aula apenas com conhecimento teórico, mas também entendendo da amplitude que é apresentada na vida eclesiástica cotidiana.

O medo de não corresponder – a Deus e as pessoas ao redor – é apontado pela entidade como um dos fatores responsáveis por grande parte das desistências do ministério e fracassos. A necessidade de aceitação, de corresponder, de mostrar trabalho e de realização são desafios internos a serem vencidos. Muitos pastores, em decorrência disto, acabam entrando no ativismo desenfreado e abrem mão dos fundamentos soberanos tão importantes no início do ministério, como oração, Palavra, obediência e integridade.

“Mudar o paradigma de “super-homem” – tenho que ser forte - e buscar apoio de outros colegas pastores e de um mentor mais experiente é o melhor caminho”, enfatiza Marcelo Fraga, coordenador do Mapi no Nordeste e pastor da Igreja Batista Filadélfia, em Natal/RN. A solidão ministerial e as pressões por conquistar um ministério de sucesso agravam estes fatores. De acordo com ele, boa parte dos pastores morre com problemas relacionados à pressão arterial e infarto. Pesquisas recentes mostram ainda que apenas 1/3 dos líderes cristãos terminam bem a carreira ministerial, enquanto os outros 2/3 não conseguem alcançar seu pleno potencial e apresentam quadros de frustração.


Formando teÓlogos, nÃo pastores

O ministério é um lugar de intensa pressão – e isso é inquestionável. Soma-se a isso, o fato de a igreja estar sempre dispensando atenção redobrada a cada passo do jovem pastor, a fim de constatar se ele irá suportar as altas temperaturas do trabalho eclesiástico. Mestre de Teologia em Estudos Bíblicos pelo International Biblical University e professor na cadeira de Teologia do Novo Testamento, Marcos André Cândido vive na pele todo esses desafios. Com apenas 27 anos de idade, é há um ano um dos pastores da Igreja O Brasil para Cristo em Nova Friburgo, Região Serrana do Rio de Janeiro. Ele acredita que, caso a formação teológica do novo ministro tenha sido enriquecida por um corpo docente experimentado nos laboratórios da vida eclesiástica, certamente estará um passo à frente dos demais. “Nossos seminários estão repletos de Mestres em Teologia, mas que são neófitos na prática ministerial”.

O Pastor presidente da igreja O Brasil para Cristo do Mandaqui, em São Paulo, com mais de 1.200 membros sob sua responsabilidade direta, Joel Stevanatto afirma que a inexperiência pode produzir a sensação no coração do pastor de convicção absoluta e isso pode acabar levando o novo líder a uma (perigosa) independência de Deus. “Nesse caminho ele se torna precipitado em decisões e dependendo do perfil de cada novo pastor os sintomas serão expressos de maneiras diferentes”, frisa.

É nesse momento que algumas reações podem surgir com maior intensidade e revelar os que são sonhadores e começam a planejar coisas mirabolantes e terminam no campo da frustração, e outros que são medrosos e acabam completamente paralisados. Aliás, o bombardeio a qual está submetido quem está à frente de uma igreja, sobretudo em se tratando de um líder inexperiente, pode gerar uma série de problemas de ordem psicossomática, como síndrome do pânico, em graus mais elevados, e também de ordem física, como arritmia cardíaca, dificuldades na fala e gastrite –esta última entre as mais comuns.

“Na verdade, tudo isso tem como causa primária a difícil correlação entre a ansiedade pelos resultados e os resultados em si de um trabalho que se inicia. Uma expectativa frustrada pode ser fatal”, alerta a psicanalista Sueli de Almeida, que diz ainda ser necessário em muitos casos o acompanhamento de um terapeuta.

A diversidade cultural, de faixa etária e social não consegue resumir todo o leque de desafios para quem assume a responsabilidade de conduzir um povo. Na verdade, é apenas parte disso. Neste pacote há espaço ainda para a desconfiança de líderes mais experientes, que muitas vezes se sentem ameaçados pelo novato, a falta de material humano para o desenvolvimento de projetos e ações que vão garantir maior respaldo ao trabalho, e ainda a ausência de recursos financeiros que impede a realização de novos trabalhos. Neste momento, criatividade e perseverança parece ser a receita para quem pretende seguir adiante. Por mais paradoxal que seja o momento de maior fragilidade de um pastor é justamente não querer demonstrar a sua fragilidade. Alguns enfrentam problemas sérios pessoais, eclesiásticos e por não terem sidos treinados a buscar ajuda arriscam numa solução. Um dos coordenadores da Equipe de Liderança do Sepal (Servindo Pastores e Líderes), no Rio de Janeiro, Ayr Correa Filho garante que pedir auxílio a pastores mais experientes não é sinal de fraqueza, mas de sabedoria do novo ministro.

“Pastor precisa demonstrar que é gente como demais membros da sua igreja. Basta se apresentar para ser pastoreado também. Isto o torna mais forte e capaz”, aposta Ayr, que é o pastor presidente da Terceira Igreja Batista em Rocha Miranda, no Rio, e tem bacharelado em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil.

Por certo, o maior temor de um pastor recém-consagrado é, mesmo sendo um pastor de direito, não se tornar um pastor de fato. Ter o título, mas não exercer a influência pastoral na vida das pessoas, é inquietante, quase um fantasma. Há um provérbio de liderança que diz: “Aquele que pensa que lidera, mas não tem seguidores, está apenas passeando”. O grande temor, sem dúvida, é passear ao invés de apascentar.

fonte: http://www.revistaenfoque.com.br/index.php?edicao=86&materia=1177

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